Porto Nacional
Recentemente postei aqui no alguns
descrições da viagem que fiz a Brasilia para tratar da coleta de dados
biométricos e da entrevista para a solicitação do visto americano J. Coloquei
algumas fotos de alguns dos belos lugares por onde passamos no trecho entre
Arraias (TO) e Alto Paraíso (GO).
Eu já havia feito essa viagem
antes de ônibus, com saída de Porto Nacional as 20:00 e retorno saindo
de Brasilia as 19:00. Ou seja, nessas viagens de ônibus todo o
trajeto é feito durante a noite e os passageiros somente tem acesso visual aos
pontos onde ocorrem as paradas: rodoviárias das pequenas cidades ao longo do
trecho ou parada em alguma lanchonete/restaurante, como aquela da cidade de
Terezina de Goiás, onde se come um pastel muito crocante (mesmo que seja de
madrugada).
Pois bem. Fiz esta viagem na ultima
segunda feira, indo a Brasilia retirar os passaportes meu, de Lígia e Irepti,
com os respectivos vistos. E agora ao passar pelos lugares, tendo conhecimento
sobre a paisagem do local, a sensação foi muito diferente. Ao parar em Terezina
de Goiás, antes eu via apenas a lanchonete e, fora dela, a escuridão. Mas
agora, sabendo que a cidade é ladeada por uma bonita serra, a minha percepção
da localidade foi muito diferente, afinal eu sei que a serra e toda a linda
paisagem esta lá.
E o que tem isso a ver com ensinamentos?
Bem, que conhece a mito da caverna, de Platão, pode perceber a semelhança das
situações. Quando eu "conhecia" o caminho apenas na escuridão, eu não
sabia o que estava além do espaço iluminado. Tudo que eu podia fazer era
imaginar o que haveria depois: talvez a periferia da cidade, talvez um campo de
cultivo de soja, talvez pequenas propriedades de criação de gado leiteiro. Mas
agora, ao ver o lugar sob a luz do dia, eu sei como ele é.
Assim também acontece comumente quando não
conhecemos lugares, pessoas, povos. É como se viajássemos na
escuridão. E acabamos formando nossa opinião apenas por pequenas luzes que são
as informações que recebemos de outros sobre o assunto.
Vou exemplificar com o caso da cidade de
Manaus e com os povos indígenas.
Nos últimos dois anos tive a oportunidade
de conviver bastante em Manaus devido ao curso de Doutorado de Lígia na UFAM.
As informações que nos chegam sobre Manaus através da mídia de massa (entenda-se
sobretudo sistema Globo) nos leva a criar uma imagem de Manaus que não
corresponde a realidade. E um Globo Repórter em que uma equipe de reportagem
navegou o rio Amazonas a partir de Iquitos enquanto outra a partir de Belém,
quando o âncora se referiu a Manaus, mencionou o Teatro Amazonas, como uma ilha
de cultura do período da borracha, no meio da selva. Por informações como essa,
antes de conhecer Manaus eu imaginava o Teatro Amazonas como uma edificação
muito linda (que de fato é) cercado pela pobreza. Mas ao conhecer Manaus e o
Teatro (sob a luz do dia e sem a escuridão do mass midia brasileiro), minha
visão mudou completamente. A região central da cidade de Manaus ainda conserva
uma arquitetura belíssima, com estilos do final do século XIX e primeira metade
do XX. No entorno do Teatro Amazonas existem edificações belíssimas. O espaço
cultural São Sebastião, com o tacaca da Gisela (e o evento do tacaca na bossa,
organizado pleo Joaquim toda quarta-feira) e diversos espetáculos ao ar livre,
fazem do lugar um espaço muito agradável. Neste espaço pude assistir diversas
apresentações de ópera, teatro, musica e desfile de carnaval. Os prédios do
Tribunal de Justiça, a praça do Congresso, recentemente recuperada, bem
como o Instituto de Educação do Amazonas e a praça da Saudade, fazem desta
parte do centro de Manaus um espaço muito gostoso de conviver. É claro que
Manaus tem problemas, como toda cidade tem, mas entende-la pelas informações
que recebemos dos meios de comunicação, é como viagem no escuro.
O mesmo vale para todos os povos,
indígenas ou não. Quando recebemos informações apenas dos meios de comunicação,
viajamos na escuridão e mantemos visões que imaginam o que estaria compondo a
paisagem. E acabamos caindo em preconcepções. Mas quando nos dedicamos a ir lá,
ver, ouvir e depois escrever sobre eles, vendo-os sob a luz do dia, nossas
percepção é outra e a Antropologia tem esse ponto de ser um instrumento para
aproximar os povos fazendo a tarefa de transformar o exótico em familiar, ao
mesmo tempo que transforma o familiar em exótico.
Da mesma maneira, espero que esta viagem
de seis meses aos USA seja uma viagem diurna. E ajude a compreender melhor
aquele país. Assim como Manaus, também dos Estados Unidos temos muitas
informações fornecidas pelo mass midia.
Quando estive lá pela primeira vez foi em
abril de 2002. Faziam 7 meses do ataque de 11 de setembro. E já se iniciara os
ataques ao Afeganistão e se preparava para o ataque ao Iraque. A questão da
guerra era algo corriqueiro. E como fiquei apenas cinco dias daquela vez em
Atlanta não trouxe muito boas impressões sobre lá. Para nós brasileiros a
guerra é algo bastante distante. Mas para os americanos, parece que a guerra é
algo cotidiano. Ouvi de um amigo historiador que a guerra é algo inevitável. Espero
que com esta viagem, então, poder entender melhor algumas coisas da América do
Norte e não ficar viajando apenas na escuridão.
Acabo de ver o blog da Associação Pempxa, do povo Apinaje. Esse uso de recurso
midiático, feito pelos próprios indígenas, é um bom caminho para nos ajudar a
fazer viagens diurnas.
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